Thursday, November 15, 2007

Behind the curtain...






Posso estar a cometer a maior gaffe socio-cultural de todos os tempos mas acho que já não é novidade para ninguém que David Lynch é um realizador de culto. Ou melhor, que os seus filmes se tornaram alvo de culto. E são muitos os que seguem avidamente a sua obra. Falo de obra porque Lynch não se limita ao cinema, ele expande-se. E cobre áreas como a pintura, a fotografia, a instalação, a performance ou genericamente falando as "artes plásticas". Independentemente dos materiais, as ideias fluem, vão tomando forma e conduzem-no a algum lado. É assim que trabalha a sua mente.

Por ocasião do European Film Festival, o "rapaz" nascido em Montana nos EUA, vai estar em Portugal. Já estou a imaginar um corredor bastante estreito, numa fábrica industrial e uma multidão seguindo um vulto que parece estar e não está. É melhor não me dispersar. Que me desculpem os mais susceptíveis mas esta será provavelmente, a par de Pedro Almodovar, a melhor surpresa da primeira edição deste festival. E uma pequena batalha ganha por Paulo Branco. Só pelo feito, alguém por favor tenha a boa vontade de o premiar com a medalha da cultura, se é que isso existe tendo em conta que o orçamento do Estado para a dita é de 0,4 %. Cá para mim a décima que impediu de chegar aos 0,5 foi para custos adicionais. Agora do quê é que se me escapa completamente.

Se não fosse o facto do aparelho ter avariado já quase no final da projecção tinha saído qual Laura Dern, da sala do Casino do Estoril, de sorriso bem rasgado. O motivo: L Y N C H.
O documentário realizado por black and white, é estranho mas o senhor chama-se mesmo assim, consegue dar-nos uma visão interior do autor e do seu processo criativo. Foge ao esquema de pergunta e resposta e usa a câmara apenas como olho observador. O resto falo por si. Com uma canon EOS-1 reuniu quase três mil fotografias de interiores de fábricas na Polónia. As linhas que compõem cada uma delas, para além de realçarem o já interessante aspecto original, mostram-nos a sua capacidade infindável para reter pequenos detalhes. Pelo meio grava o ruído de uma grafonola, a agulha deslizando asperamente sobre o disco, serra um búfalo de madeira ao meio e coloca-o numa tela, zanga-se ao telefone, tinge um blazer de verde fluorescente e fuma.

A montagem deste documentário respeita e homenageia Lynch. Por muitas descrições que pudesse fazer nenhuma lhe faria justiça. As sensações bastam e no final, ou quase porque o equipamento decidiu fazer birra ou se calhar engripou-se com as temperaturas pouco convidativas, entranha-se na pele. Não admira, Lynch é intuitivo.

Intuitivamente: é um quadro em movimento, repleto de ideias, espaços, sons, imagens... Todos fluem.

P.S: resta esperar que os direitos do filme sejam comprados para ter estreia comercial. Ou então aguardar por Abril quando sai em dvd nos EUA.

3 Comments:

Anonymous Anonymous said...

O David Lynch criou um dos meus pares favoritos do cinema e, já sabes, eu vejo muito o cinema com os olhos do coração. É a Lula e o Sailor do Wild at Heart, nunca me esqueci da cena em que ela, por não lhe conseguir dizer que está grávida, escreve isso num papelinho. É só um detalhe, tonto e encantador como a personagem da Laura Dern, mas também é destes pormenores que se constrói a nossa memória cinematográfica. Acabo de escrever isto e lembro-me da Isabela Rossellini no Blue Velvet, linda e completamente “danificada”!
A atmosfera dos filmes dele é singular, ao ponto de sabermos imediatamente quando estamos a ver Lynch. E não estou a falar dos argumentos labirínticos que dão origem a modelos matemáticos!, mas da forma como, por exemplo, a câmara parece planar por cima das história e das personagens. Como se estivesse alguém ali que não quer ser identificado, que sabe de tudo, mas cuja presença quer que seja notada por nós. E sim, ele é um realizador de culto. Espero que, como dizes, o documentário lhe faça justiça, e que ele dê uma boa conferência de imprensa.
A propósito, parabéns pelo blogue. :)
Bjs grandes
Simone

15 November, 2007 15:55  
Blogger João Roque said...

Que o Lynch é um realizador de culto, é um facto;ma da sua obra, o que eu mais admiro é o par já falado do "Coração selvagem" (indiscutìvelmente Laura Dern é a sua musa) e é esse apaixonante e linear(que estranho isso em Lynch...)filme da viagem de um velho através da América (Uma história simples).
Beijoquitas.

15 November, 2007 19:02  
Blogger Anita said...

ai... o que eu gosto da obra deste senhor... mesmo quando alguns dos seus filmes me deixam às aranhas lol...

Há algo de único e original na sua forma de filmar e nas histórias que conta, o que é raro hoje em dia... :)

Sou sua fã desde o mítico Twin Peaks... lembro-me que era miúda demais para compreender metade daquilo, mas mesmo assim não arredava pé... fosse o fosse aquilo entranhava-se... durante os anos que se seguiram fui acompanhando a sua carreira nunca ficando desiludida... cada filme é diferente... até que surgiu aquela que é para mim a sua obra prima e um dos meus filmes favoritos, Mulholland Drive...

Cada filme é um mundo de sensações, onde as coisas fazem sentido não pela lógica mas pela forma como nos faz sentir... a espera parece sempre longa, mas vale sempre a pena quando nos sentamos e o visitamos na sua salinha escura...

Beijinhos

16 November, 2007 02:21  

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