Monday, January 21, 2008

Listen...



E se um argumento pudesse ser escrito em pautas de música? Qual seria o resultado? Timecode.

Mike Figgis queria contar quatro histórias ao mesmo tempo, ou será uma história em quatro tempos? É uma mistura. Basicamente o realizador de Timecode criou uma base narrativa e seguiu os vários personagens nessa narrativa. Assim e em simultâneo podemos ver o que se passa numa consulta com o terapeuta, num casting, na produtora onde o casting se derenrola e numa limousine. Mas reduzir o filme de Mike Figgis apenas a esta descrição seria um insulto. A verdade é que todos os ecrãs se conjugam num só: a música. E porque se trata mesmo de uma partitura, ele conduz-nos pela vida de cada personagem como se de uma orquestra se tratasse. O som sobe ou desce conforme o destaque que ele quer dar a determinado personagem. Por vezes temos dois personagens com som em simultâneo, se bem que ligeiramente desnivelados, para podermos ouvir o ruido de uma conversa sobre outra que se desenrola mais alto. Parece confuso? Mas não é. E no formato DVD ainda temos outra vantagem que é sermos nós próprios os maestros e escolhermos que som se sobressai a outro e em que altura. Mas independentemente das nossas escolhas, uma é comum e atravessa todas. Os "monólogos" de guitarra acompanhando a solitude de um trompete ou a voz de Tracy Horn trespassando os silêncios "audiveis" em cada ecrã.


Se a banda sonora de Leaving Las Vegas era um quadro, Timecode é um quadro em movimento. E com ele o cariz de obra-prima. A cada pincelada, um novo rasgo de beleza. A versão final podia não ser a final. Figgis filmou 15 takes de 90 min cada, ininteruptos. Depois montou cada um em directo com os actores. Para que os próprios se apercebessem do que podiam melhorar ou inovar no take seguinte, aliás nos 90 min seguintes. E disse inovar porque os actores apenas dispunham da partirura, da base, os diálogos tinham de ser compostos por eles próprios. Sincronizavam-se câmaras, relógios, e assim que a contagem chegava ao Acção!, 4 câmaras acompanhavam diferentes personagens em partes distintas da cidade de Los Angeles. Ao longo de 15 takes de 90 min cada, os "músicos" foram afinando a sua técnica e quando chegou o último take estavam mais que prontos para continuar. Mas apenas puderam ser 15.
Depois de várias montagens, ficou apenas uma. Sem contar com outra versão que vem no DVD e com as 3 versões que Figgis montou em directo para os espectadores, em 3 sessões em 3 locais de estreia nos EUA. Mas infelizmente estas não chegaram a DVD.

Uma partitura musical que dá um significado completamente diferente à palavra improviso.
Escolha o que quer ouvir, faça a partitura que bem entender. Mas primeiro veja a de Figgis. Não há palavras para conseguir descrever a harmonia entre imagem e som. Siga o sinal de Figgis.

Alguma vez quis ouvir o que se diz quando sai da sala?
Escute. Agora.

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